A Marrabenta é o principal ritmo musical de Moçambique, bem no coração da sua identidade. Ritmo urbano, a sua estilização deve-se a pessoas urbanizadas que, distantes do seu meio social e cultural e sujeitos à influência da cultura ocidental, criaram este ritmo.
Índice
Introdução. 1
Marrabenta. 2
Origens da Marrabenta. 2
Factores que contribuíram para a estilização da Marrabenta. 3
Estilização da Marrabenta 1950-1960. 4
Os primeiros conjuntos Afro-Moçambicanos. 5
Promoção e divulgação da Marrabenta 1961-1974. 6
A Marrabenta no Pós-Independência 1975-2002. 7
A ‘Marrabenta’ no presente. 8
Conclusão. 10
Bibliografia. 11
Introdução
Marrabenta é uma forma de música-dança típica de Moçambique e o seu nome foi derivado da palavra portuguesa: "rebentar". Incorporou vários ritmos folclóricos como os Magika, Xingombela e Zukuta, sendo também sujeita à influência ocidental. Foi desenvolvida em Maputo, a capital de Moçambique, que até à independência daquele país, era conhecida como Lourenço Marques.
Começou no final dos anos 30, com artistas mais antigos como Fany Mpfumo e Dilon Djindji, que iniciaram a sua carreira em 1939. Torna-se popular na década de 1950 com conjuntos como Djambu e Hulla-Hoope Harmonia.
A popularidade da marrabenta atinge novo pico na década de 1980 com bandas como Eyuphuro e Orquestra Marrabenta Star de Moçambique. Mais tarde, a banda moçambicana Mabulu mistura o estilo rap e marrabenta.
Marrabenta
A Marrabenta é o principal ritmo musical de Moçambique, bem no coração da sua identidade. Ritmo urbano, a sua estilização deve-se a pessoas urbanizadas que, distantes do seu meio social e cultural e sujeitos à influência da cultura ocidental, criaram este ritmo, pegando noutros já existentes como a Magika, Xingombela e Zukuta. Começou no final dos anos 30, mas será na década 50 que se tornaria popular com conjuntos como Djambu, Hulla-Hoope Harmonia.A marrabenta incorporou vários ritmos folclóricos, é produto da miscegenação cultural das gentes do Sul do Save, e da dinâmica sócio-cultural. A sua estilização verificou-se nas Associações de Naturais que tiveram um papel importante na defesa da cultura e identidade cultural dos africanos no período colonial caracterizado pela supressão sistemática de qualquer manifestação cultural por parte dos nativos, consideradas folclóricas.
Assim, as Associações, Associação Africana (AA) e o Centro Associativo dos Negros da Província de Moçambique (CANPM) vão contribuir para o resgate da identidade e cultura moçambicana apesar da obrigatoriedade de cantar e dançar músicas e ritmos portugueses entre 1912 a 1975, aquando da Independência. Para a adopção e promoção da cultura moçambicana, destaque-se o trabalho de José Craveirinha (Associação Africana) e Samuel Dabula Nkumbula (Centro Associativo dos Negros) que, devido à consciência politica e cultural, contribuem para a adopção e promoção de ritmos, músicas e danças africanas nas associações. A Marrabenta passou por várias fases.
Origens da Marrabenta
Par animado a dançar Marrabenta, a Marrabenta terá tido origem na região sul de Moçambique como demonstrado pela língua utilizada e pela maioria dos seus praticantes que são todos oriundos desta região que comporta Maputo, Gaza e Inhambane.
O nome Marrabenta provem de rebenta, associada ao dançar em excesso. Nas décadas de 30 e 40 na Mafalala, um dos principais bairros suburbanos da então Lourenço Marques, terá surgido o nome Marrabenta . Na Mafalala, na Associação Beneficiente Comoreana, sala de recreação e diversão, então conhecida pelos locais como ‘Comoreanos’ terá surgido o nome ‘Marrabenta’. O local era assim chamado pelo facto dos seus associados serem provenientes das Ilhas Comores. O ‘Comoreanos’ era um Cabaré onde a população suburbana se divertia. Então, um dos ritmos que se dançava ali era a ‘Marrabenta’ que até então, anos 1930, não tinha nome.
Factores que contribuíram para a estilização da Marrabenta
A estilização da Marrabenta terá resultado da combinação do movimento migratório de Moçambique para a África do Sul e vice-versa, realizado predominantemente por indivíduos de origem rural que emigravam para as minas sul-africanas à procura de melhores condições de vida. No seu regresso, introduziam ritmos, aparelhos, discos e músicas apreendidas e ouvidas na África do Sul junto às suas famílias. Desta forma faziam com que estes entrassem no meio rural ou suburbano de Lourenço Marques, provocando a familiarização do meio sócio-cultural com estas novas expressões culturais, levando à gradual aculturação dos seus familiares mais próximos e habitantes.
A rádio contribuiu bastante para a propagação destes ritmos devido à preferência da população africana por esta fonte de informação dado que a maioria da população era analfabeta e sem acesso à informação escrita. As bandas americanas e sul-africanas também tiveram a sua influência. As bandas americanas tinham adeptos junto de um público africano mais evoluído que escutava as bandas americanas de jazz, enquanto que as bandas sul-africanas eram preferidas pelos emigrantes moçambicanos que estavam em contacto directo com a música negra sul-africana. Assim, a vinda de bandas sul-africanas a Moçambique vai despertar nos moçambicanos a vontade de as imitar. Pois, em 1951, chega a Moçambique o agrupamento sul-africano ‘Zonk’, constituído por negros. Foi a primeira vez que se viu e ouviu uma guitarra eléctrica em Moçambique tocada por negros. Isto teve um enorme impacto sobre a população negra, como se pode imaginar.
As associações contribuíram para o surgimento e desenvolvimento de uma consciência cultural, social e politica, apesar das restrições impostas pelo Estado colonial Português. Ao permitir a sua criação e surgimento, o Estado colonial tinha em vista o controlo, orientação e a introdução de elementos da cultura portuguesa no seio destes grupos e, ao mesmo tempo, impedir a formação de uma frente comum por parte dos colonizados.
O surgimento da Marrabenta nas associações foi o culminar do processo de ‘Regresso às Origens’, iniciado na década de 1940 por vários pensadores e dirigentes africanos. Este movimento foi liderado por um grupo de intelectuais e usava como armas a culinária, a poesia, a música, o desporto e arte para afirmar valores e a identidade africana. Deste período destacam-se poetas como Rui de Noronha, com o poema ‘Surge et Ambula’, publicado em 1936, e Noémia de Sousa com ‘Sangue Negro’ de 1949. O momento mais celebrado deste movimento acontecerá em 1959, com a realização do espectáculo musical denominado ‘Concerto de Música Folclórica’ envolvendo as bandas ‘Hulla-Hoop’, ‘Harmonia’ e ‘Djambu’ na AA. Este evento foi o primeiro da história da música negra moçambicana segundo o ‘Brado Africano’ , que o apelidou ‘O Concerto Musical do Ano’. A experiência serviu para confirmar a viabilidade da execução de números folclóricos. Os agrupamentos musicais contribuíram, por seu turnom para a difusão da música ligeira entre a população africana, para a divulgação dos ritmos moçambicanos e a sua penetração no seio da população colonial. A dinâmica exibida pelas associações na segunda metade da década de 50 na defesa e promoção da cultura africana deveu-se às duas importantes figuras: Craveirinha na AA e Dabula no CAN.
Estilização da Marrabenta 1950-1960
A estilização da Marrabenta verificou-se pela interpretação de músicas populares com instrumentos de origem europeia. Este processo deu-se a 1958/9 com a realização do primeiro espectáculo de música negra em Moçambique, como fizemos referência na secção anterior. O espectáculo foi um sucesso, pois os espectadores vibraram do princípio ao fim. Era a primeira vez que assistiam a um concerto cuja temática era apenas a música local. Neste processo destaca-se a Orquestra Djambu que se encontrava sediada no CAN, o Conjunto Hulla Hoop, mais tarde João Domingos e o Conjunto Harmonia.
Os primeiros conjuntos Afro-Moçambicanos
Young Issufo em plena actuação
Young Issufo Jazz Band foi o primeiro conjunto Mocambicano constituído por indivíduos de raça negra. Foi fundado em 1956 por Young Issufo como um quarteto passando a sexteto em 1957. A ideia de Young Issufo era criar um grupo africano que fizesse frente às bandas sul-Africanas que vinham actuar em Moçambique na década de 50. A formação original era constituída por Domingos Mabombo, Manuel Hassane, Orlando, Jose Manuel, Moises Manjate e Young Issufo.
Orquestra Djambu em plena actuação
Orquestra Djambu forma-se em 1958 após a dissolução do Young Issufo Jazz Band em 1957. A banda integra-se ao CAN sob a direcção do professor Samuel Dabula. Inicialmente tocam Blues e Jazz, só mais tarde tocam marrabenta.
Agrupamento João Domingos numa caricatura de João Domingos
Conjunto Joao Domingos, fundado por Young Issufo e Hassiade Mumino (Gonzana) em 1958 como Hulla-Hoop passa a João Domingos em 1960. Fica associado à Associação Africana (AA) sob a liderança de José Craveirinha. Conjunto Harmonia, provável data da sua formação é 1958. Na sua formação participaram Rachide e Miguel Mabote na Mafalala, também integram-se na AA.
Promoção e divulgação da Marrabenta 1961-1974
A promoção e divulgação da marrabenta acontece na década de 1960 devido à situação política verificada nas colónias portuguesas. Em 1961 tem início a guerra da Angola que terá como consequência a abolição do estatuto indígena do Negro nas colónias, concessão ao mesmo de liberdades cívicas até então negadas, nomeação de um Ministro das Colónias liberal, Adriano Moreira cujo consulado iria durar 18 meses , por um lado. Por outro, vai-se verificar a adopção de políticas multirracias e multiculturais que irão dar espaço aos ritmos africanos e criação de programas especiais como o ‘Africa à Noite’, ‘Voz de Moçambique’ na então Rádio Clube. Nesta altura gravam-se dois discos de conjuntos afro-moçambicanos, nomeadamente o conjunto João Domingos em 1963 e, em 1965, do disco ‘Marrabenta’ da Orquestra Djambu. Do disco da Orquestra Djambu sairá a famosa música da Marrabenta, ‘Elisa Gomara Saia’ que dizem que o ‘Duo Ouro Negro’ terá plagiado e reclamado a sua autoria.
A Marrabenta no Pós-Independência 1975-2002
António Williamo e Muchina, um par inesquecível da Marrabenta
Com a independência em 1975, a Marrabenta é desqualificada devido à nova realidade política, económica e cultural. Procura-se valorizar a música tradicional moçambicana, que teve nos festivais realizados, nomeadamente o Festival nacional de dança tradicional e o de música tradicional de 1980, um dos seus momentos mais altos. De acordo com Luís Bernardo Honwana, a Frelimo era um partido de base essencialmente rural, o que levou à divulgação destes valores com vista à promoção da unidade na nação recém-constituída o que, com a Marrabenta, não seria possível visto tratar-se de um ritmo urbano e de difícil aproveitamento político.
Outro factor que terá contribuído para a sua parca divulgação neste período, foi a crise que o país atravessou logo após a independência, resultante da fuga de empresários do sector musical, o encerramento das casas especializadas na venda de instrumentos musicais e a impossibilidade de importá-los em virtude de o país ter outras prioridades, o que provocou a regressão deste sector cultural.
A primeira tentativa séria para reavivar a Marrabenta no pós-independência só acontece em 1987 com a criação da ‘Orquestra Marrabenta Star’ período em que se procedem alterações de ordem estrutural no país, como a introdução do ‘Programa de Reabilitação Económica (P.R.E), que promove a liberalização económica, mercados e incentivo à iniciativa privada ao contrário do período anterior até 1986, caracterizado por uma economia socialista, centralizada e fortemente controlada pelo Estado. Apesar do dinamismo demonstrado inicialmente pelo agrupamento, em 1989, este viria a desaparecer devido a problemas de carácter empresarial apesar do sucesso a nível internacional.
Em 2000, verifica-se o segundo ressurgimento da Marrabenta com o projecto ‘Mabulu’ que promovia comercialmente este ritmo musical. Este projecto procede a mistura do velho e do novo com jovens cantores ‘rap’ e velhas glórias da ‘Marrabenta’. Em 2002 o projecto terminou apesar do sucesso alcançado.
A ‘Marrabenta’ no presente
A ‘Marrabenta’ continua a ter o seu espaço apesar de não existirem políticas institucionais para protegê-la e promovê-la. Todas as iniciativas feitas nesse sentido são de índole individual. De entre as várias iniciativas podem-se destacar jovens como Neyma Alfredo, actualmente considerada a ‘Diva da Marrabenta’ com várias músicas neste ritmo. Lourena Nhate é outra joven com créditos firmados, descoberta no concurso ‘Fama Show’, hoje é uma cantora de Marrabenta com futuro. Isto ilustra a popularidade de que a Marrabenta ainda goza. Paralalelamente à Marrabenta surge, entre 2005-6, o ‘Dzukuta-Pandza’ que tem em Zico o seu expoente máximo. Zico é considerado o promotor deste novo ritmo que goza de um número crescente de fãs. Uma das músicas que o catapultou para a fama foi ‘Maboazuda’ que passou a ser tocada em todas as rádios comerciais e festas realizadas no país.
‘Dzukuta-Pandza’ é um ritmo que por sinal se inspira na ‘Dzukuta’ ou ‘Zukuta’ um dos ritmos que esteve na origem da ‘Marrabenta’.
Apesar dos altos e baixos pelos quais tem passado a Marrabenta continua a ser uma referência em Moçambique. De tal maneira, que em 2008 inicia-se o ‘Festival Marrabenta’ uma iniciativa de jovens da ‘Logaritmo’. O festival acontece entre Janeiro e Fevereiro e já conquistou o público e artistas moçambicanos, assim como turistas, a julgar pelas multidões que arrasta e número de artistas participantes. É realizado na região sul de Moçambique nas províncias de Maputo e Gaza, nomeadamente na cidade de Maputo, Marracuene, Chibuto e Chokwé. Como forma de reconhecimento da sua importância, 2010 foi considerado o ano da ‘Marrabenta’ pelos músicos Moçambicanos. Pois, a ‘Marrabenta é um dos factores identitários de Moçambique. Como dizia alguém, nos anos 60, Moçambique era definido por uma trilogia: Marrabenta, Laurentina e Eusébio.
Conclusão
Terminado trabalho, concluiu-se que a marrabenta assim como qualquer outra dança, por si só já é um exercício e compõe uma actividade reguladora do metabolismo e funcionamento do organismo como um todo. Traz uma melhora significativa para quem a pratica.
Atualmente, este género tem influenciado músicos da nova geração, como Elvira Viegas, Stewart Sukuma, Mingas, Chico António, José Mucavel e o grupo Mabulu. Com o passar do tempo, a marrabenta tornou-se um símbolo cultural nacional e uma referência da identidade moçambicana.
Bibliografia
- Rocha, Aurélio. “Aculturação e Assimilação em Moçambique: Uma Perspectiva Histórico-Filosófica”. In: Actas do Seminário Moçambique: Navegações, Comércio e Técnicas. Maputo: Comissão Nacional Para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses. 1998, P. 317-350.
- Sopa, António. “Artes Plásticas em Moçambique: Para uma Percepção das Práticas Culturais (1975-1999)”. In: “Outras Plasticidades”. Coordenação de Maria Armandina Maia. Lisboa: Instituto Camões, 1999.-P.31-48.
- First, Ruth. “O Mineiro Moçambicano: Um Estudo Sobre a Exportação da Mão-de-Obra”. Maputo: UEM, 1977
- Castelo, Claúdia. “O Modo Português de Estar no Mundo: O Luso–Tropicalismo e a Ideologia Colonial Portuguesa, (1933-1961)”. Porto: Edições Afrontamento, 1998. 166Pp.
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