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O sistema tributário (o mussoco e o imposto de palhota)

Introdução
Com o objectivo de alcançar a ocupação efectiva e o desenvolvimento económico das suas colónias africanas, Portugal concessionou partes desses territórios. Numa primeira fase foram criadas Companhias Majestáticas em Moçambique. Para que estas companhias pudessem cobrar receitas que posteriormente passariam para o estado, for necessário enquadrar essa arrecadação legislativamente; assim, pelo decreto de 31 de Maio de 1887, o Ministro da Marinha e Ultramar Barros Gomesautoriza a criação de um imposto por habitação. Por outro lado prevalecia O mussoco, que era, no vale do Zambeze, em Moçambique, o principal tributo pago ao senhor de um prazo pelos que se estabeleciam no seu território, recaindo, fundamentalmente, sobre os africanos, livres e escravos. A unidade fiscal era a família, exceptuando-se desse pagamento o chefe da povoação. Este imposto era, habitualmente, liquidado em cereais, podendo sê-lo noutros géneros. Assim sendo, neste trabalho visa-se debruçar o “sistema tributário” como tema.

O sistema tributário (o mussoco e o imposto de palhota)
A institucionalização do regime de impostos no território marcou o início de um processo de transformação da economia camponesa de subsistência para a economia virada para o mercado.
O mussoco não era uma instituição nova nas relações sociais a norte do rio Púngoè.
Os camponeses, através do mussoco, renda em géneros, canalizavam parte dos seus excedentesagrícolas para a elite prazeira, sendo, muitas vezes, utilizados para a alimentação dos A-Chicundas. Era cobrado também em produtos exóticos para a exportação (marfim, mel de abelha, etc.). Coma crescente penetração do capitalismo colonial, o mussoco passou a ser cobrado em trabalho e, depois, em dinheiro, o que exprime uma profunda mudança nas relações sociais de produção.
O imposto de palhota foi introduzido ao abrigo do decreto de 9 de Julho de 1892 e cobrado à luz do Regulamento do Imposto de Palhota de 30 de Julho de 1892 — os proprietários de palhotas ou cubatas situadas no interior do território ficavam obrigados ao pagamento do imposto anual de 900 réis por palhota ou cubata utilizada como habitação.
Como o salário era quase fictício, esta medida tornou-se, de facto, um mecanismo de angariação de mão-de-obra gratuita. Portanto, o mussoco e o imposto de palhota eram um mecanismo de dominação do capital sobre o trabalho.
O regime de Caderneta Individual Indígena então instalado e o aperfeiçoamento do recenseamento colonial permitiram à Companhia um maior controlo sobre a população e, consequentemente, a obtenção de mais receitas resultantes da cobrança dos impostos.

A política concessionária
A política concessionária da Companhia de Moçambique baseava-se no direito de posse sobre a terra conferido por uma Carta Concessionária. Para a Companhia, o arrendamento da terra às empresas subsidiárias ou aos colonos constituía uma actividade especulativa muito rentável.
Existiam diferentes tipos de concessões: concessões mineiras; concessões na infra-estrutura dos transportes; concessões agrícolas; concessões para construção.

Concessões mineiras
O arrendamento de terrenos para a exploração de pedras e metais preciosos e de minas em geral, concentrava-se na actual província de Manica, na qual se vivia o mito do ouro.
Várias sociedades adquiriram claims (terrenos) em volta de Macequece, iniciando-se a prospeção e exploração mineiras (ouro). Para melhor satisfazer as necessidades de mão-de-obra barata, com vantagens e facilidades para as empresas mineiras, a Companhia de Moçambique instalou em Macequece uma delegação do Serviço dos Negócios Indígenas. O Fundo de Crédito Mineiro proporcionava aos concessionários a assistência financeira necessária.
Mas pouco desenvolvimento foi atingido na actividade mineira em Manica e muitos dosempreendedores caíram na bancarrota, por insuficiência de capitais. Como já havia acontecidona Rodésia em 1907, o mito do ouro de Manica rapidamente se desvaneceu.

Concessões na infra-estrutura dos transportes
As concessões mais importantes foram fritas à The Beira Railway, sociedade formada com capitais britânicos (da British Sctth Aftiai Company), que construiu o caminho-de-ferro Beira-Macequece, conforme o acor de fronteiras de 11 de Junho de 1891. As obras de construção, da Beira a Unão, foram concluídas a 10 de Julho de 1900.
Em 1925, um contrato celebrado entre a Companhia de Moçambique e a The Portof
Beira Development Corporation, culminou com a Construção do Porto da Beira, concluído em 1929.
Estes empreendimentos permitiram à Companhia: beneficiar das receitas derivadas dos direitos alfandegários sobre a importação e exportação e o trânsito de mercadorias de e para a Rodésia; dinamizar o incremento da agricultura colonial e das minas em Manica, baixando consideravelmente os custos de transporte; facilitar o escoamento dos excedentes da produção comercial camponesa.
Estas concessões permitiram também a integração da economia de Moçambique no espaço económico da África Austral, mediante uma articulação estrutural directa com necessidades de acumulação de capital nas colónias vizinhas (Rodésia e África do Sul).

Concessões agrícolas
Só a partir de 1895/96 é que apareceram algumas concessões de relativa importância. Entre as concessões mais importantes feitas nesses anos, contam-se: a concessão do Prazo de Gorongosa à Companhia de Gorongosa (1895); o arrendamento do Prazo de Chupanga à Companhia de Luabo; concessões de terrenos em Marromeu, Búzi e Moribane, respectivamente, à Sociedade Açucareira da África Oriental (1900); Companhia Colonial do Búzi (1898); Companhia de Moribane e muitas outras.
A actividade produtiva agrícola desenvolveu-se segundo dois eixos principais: economia de plantação com culturas viradas para o mercado externo, como a sacarina, o coqueiro, a borracha, o algodão e outras; machambas com culturas de milho, fruticultura e horticultura.

a) Economia de plantação
As plantações, monoculturas em grande escala, exigiam grandes quantidades de capitais, embora dependendo da mão-de-obra barata (trabalho forçado), e foram desenvolvidas pela Companhia de Moçambique, por algumas subconcessionárias (Companhia Colonial do Búzi, Companhia de Açúcar de Moçambique, The Sena Sugar Factory, ...) e também por alguns colonos nas margens do Zambeze e do Búzi. Deste sector saía, a partir dos anos 20, uma grande parte das exportações do território.

b) A agricultura dos colonos em Manica e Sofala
A Carta Orgânica da Constituição da Companhia obrigava-a, perante o governo português, a instalar no seu território, nos primeiros cinco anos de actividade, mil famílias de colonos portugueses ou seus descendentes. Neste sentido, a Companhia deveria providenciar os seguintes adiantamentos aos colonos: habitação; terrenos de cultura; alfaias agrícolas, fertilizantes e outros insumos.
Os primeiros anos foram desastrosos para os colonos: mortes, desaparecimentos, fugas para os territórios vizinhos por motivo de insolvência e troca de agricultura pela actividade comercial foi o saldadas actividades dos colonos.
A causa do fracasso da colonização teria residido na falta de capital e de preparação técnica ou de experiência prática de agricultura, numa altura em que o conhecimento das condições agrícolas da região eram diminutas. Tal situação tornava-os dependentes do apoiada Companhia em tudo.
No entanto, a partir de 1910, e com a subida ao governo do território do ex-chefes circunscrição de Manica, João Peryde Linde, firme defensor dos interesses dos colonos, a Companhia começou a ganhar confiança na agricultura dos colonos pela importância que a sua produção poderia ter no abastecimento do mercado interno, sobretudo da comunidade colonial, cada vez mais numerosa. Assim, a Companhia intensificou a sua política de atracção de mais colonos, oferecendo-lhes consideráveis vantagens.

Foram estas:
Crédito agrícola;
Assistência técnica (aluguer de máquinas, fornecimentos de fertilizantes, distribuição de sementes e sacos);
Cedência de terras férteis;
Facilidades na angariação de mão-de-obra barata;
Facilidade de os colonos pagarem em longas prestações os preços das suas concessões.
As propriedades dos colonos concentravam-se ao longo da linha férrea Beira-Macequece e o milho representava a cultura principal, destinando-se ao consumo interno e à exportação.

Também se praticava a fruticultura e horticultura.
Entre 1892 e 1942, a história da agricultura dos colonos foi marcada por uma violenta luta entre a classe dos agricultores colonos apoiada pela Companhia e o campesinato africano.
O objectivo dos agricultores colonos era não só transformar o campesinato africano numa força de trabalho barata mas sobretudo impedir a concorrência da agricultura comercial camponesano mercado, que ameaçava a sobrevivência da população colona, particularmente daquela que cultivava milho.

c) A pequena produção familiar camponesa nos territórios de Manica e Sofala
A agricultura familiar tinha uma importância relativamente pequena para o equilíbrio abalança comercial do território, pois, além do algodão, poucos eram os produtos dos camponeses utilizados para a exportação.
Os produtos que mais se destacavam na agricultura familiar eram, além do algodão, a borracha, o milho, o arroz, a mandioca, a mapira, a mexoeira, os feijões e as oleaginosas, cujos excedentes eram comercializados para complementar a dieta alimentar dos trabalhadores.
A cultura do algodão ocupava o primeiro lugar entre os produtos destinados à exportação.
A Companhia distribuía gratuitamente as sementes, detinha o monopólio da comercialização, fixava os preços e garantia a supervisão geral. Sendo uma cultura quase inteiramente sob o controlo da Companhia, os camponeses tinham de vender o produto a preços fixados pela mesma, por vezes muito desvantajosos.
Na economia do território, o milho representava a cultura mais importante pelo seu papel na alimentação da população em geral e dos trabalhadores em particular. A mesma importância tinha a mandioca, dada a sua abundância e facilidade de produção.
Como produtor para o mercado, o campesinato especializou-se na produção de algodão e na extracção da borracha, dois dos principais produtos de exportação. Além disso, o campesina toabastecia o mercado interno com produtos como o milho, a mandioca e outros, destinados alimentação dos trabalhadores das empresas e outros sectores.

A política laboral
O capitalismo colonial só se podia desenvolver através do domínio e exploração do trabalho assalariado nas plantações, nas machambas, nas explorações mineiras e noutros sectores.
Contudo, os camponeses, possuindo meios de vida próprios, não tinham no trabalho assalariado a sua fonte de sobrevivência. Para levar os camponeses com terras e outros meios atornarem-se assalariados foi necessário desde logo uma violência extra-económica capaz de os arrastar para o trabalho assalariado e também forçado.
O campesinato encontrava na produção doméstica uma fonte suficientemente remunerada para as suas necessidades, manifestando-se pouco receptivo às solicitações de trabalho. Por isso, a Companhia de Moçambique teve de utilizar outros métodos para garantir o fornecimento de mão-de-obra a preços baixos e o consequente desenvolvimento da economia colonial. A primeira medida tomada foi a institucionalização do imposto em dinheiro.
Para centralizar o recrutamento e a distribuição de mão-de-obra, criou-se, em 1895, a Inspecção-geral dos Negócios Indígenas, repartição central responsável pela direcção superior de todos os assuntos relativos às relações com a população africana, particularmente a cobrança de impostos e o fornecimento de trabalhadores para os serviços da Companhia e de particulares, bem como a relação com os chefes tribais.
Em 1907, entrou em vigor a principal legislação de trabalho aprovado pelo governo português para o território, nomeadamente: o Regulamento Geral do Trabalho dos Indígenas no território da Companhia de Moçambique; o Regulamento para Fornecimento de Indígenas a Particulares no Território de Manica e Sofala; o Regulamento para o Recrutamento de Indígenas de Manicae Sofala. Três aspectos essenciais ressaltam desses regulamentos:

a) A institucionalização do trabalho forçado
Impunha-se, pela lei, a obrigatoriedade de prestação de trabalho assalariado por todos os indivíduos em idade activa. Nos termos dessa lei, o camponês via-se perante um dilema: ou vender coercivamente a sua força de trabalho ou dedicar-se a culturas viradas para a exportação em ambos os casos, em detrimento da economia familiar de subsistência.

b) Estabelecimento de um rigoroso sistema de controlo da força de trabalho
A Companhia determinou que cada trabalhador devia ser portador de um certificado declarando o tempo de serviço prestado e as respectivas datas de início e de termo do contrato. Para complementar esta medida, em 1926/7 entrou em vigor o regime de Caderneta de Identificação Indígena para os indivíduos do sexo masculino com idade aparente ou provada superior a14 anos. Na referida caderneta registavam-se os contratos de trabalho cumpridos e a sua história criminal. Os chefes de circunscrição e os seus subordinados, régulos ou Inhacuacua, chefes de povoação ou fumos, sipaios e outros auxiliares foram incumbidos de garantir o cumprimento deste sistema.

c) Interdição de recrutamento para serviços fora do território
A chamada emigração clandestina foi considerada crime e, como tal, punida com penas que iam até 20 meses de trabalho forçado sem remuneração. Um policiamento rigoroso devia impedira fuga dos trabalhadores para fora do território, em particular para a Rodésia do Sul, Niassalândia, África do Sul ou outras partes da colónia.
Estas medidas não só permitiram à Companhia minimizar o problema da escassez da mão-de-obra, como possibilitaram o pagamento de baixos salários, mesmo aos trabalhadores classificados como «voluntários».

Tiveram como consequências:
Fugas para os países vizinhos ou outras zonas da Colónia;
Adopção, por parte dos camponeses, de nomes falsos;
Falta de mão-de-obra;
A Revolta de Báruè de 1905 e 1917.
Face à crise, João Pery de Linde decidiu criar, em 1911, a Repartição do Trabalho Indígena(RTI), com a função de centralizar a procura e oferta de mão-de-obra. Persuadiu os donos dasquintas a aceitarem trabalhadores provenientes dos distritos de Moçambique, Tete e Zambézia, além da mão-de-obra recrutada localmente. Mais tarde (1926/7), a angariação de trabalhadores para serviços particulares deixou de ser feita pelos funcionários da Companhia, passando a ser feita pela Associação do Trabalho Indígena.

Conclusão
O regime de impostos obrigatórios foi um dos instrumentos fundamentais de compulsão do campesinato para o trabalho assalariado e uma das principais fontes directas de obtenção de receitas por parte da Companhia.
No início (1890), este imposto podia ser cobrado em dinheiro ou géneros. A partir de 1894, passou a ser cobrado obrigatoriamente em dinheiro. O não cumprimento desta obrigação era punido com trabalho forçado durante o número preciso de dias necessário para que se perfizesse quantitativo do imposto, acrescentado de 50%.
Verificou-se também que só a partir de 1895/96 é que apareceram algumas concessões de relativa importância. Entre as concessões mais importantes feitas nesses anos, contam-se: a concessão do Prazo de Gorongosa à Companhia de Gorongosa (1895);

Bibliografia
PEREIRA, José Luís Barbosa, Pré-Universitário – História 12, 1ª edição, Longman Moçambique, Maputo, 2010

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