Três Modelos de Administração Pública: patrimonialista, burocrático e gerencial
I - Patrimonialista
A noção que se pode atribuir como dominante neste modelo é: o aparelho do Estado visto como uma extensão dos domínios do soberano (governante). A res publica se confunde com a res principis.
Neste contexto, capitalismo e democracia tornam-se dominantes. Sociedade civil e mercado se distinguem do Estado.
II - Burocrática
Paradigma que assume posição hegemônica a partir da metade do século XIX, na esteira da ascensão do “Estado liberal”. São diretrizes estruturantes deste modelo: - a existência de princípios orientadores dos procedimentos; - o desenvolvimento dos sensos de profissionalismo e capacitação técnica; - noções de carreira, hierarquia funcional, impessoalidade, formalismo (racionalidade).
Dado o caráter estático e rígido do modelo burocrático, não tardou o surgimento de efeitos negativos – as denominadas disfunções do modelo burocrático estudadas por R. K. Merton.
Referidas disfunções e excessos, vale salientar, atingiram níveis que passaram a comprometer a capacidade de sustentação do modelo (legitimidade).
Em razão destes fatos ganham força as propostas de reformulação do modelo.
III - Gerencial
O paradigma gerencial surgiu como alternativa modernizadora do aparelho do Estado com vistas a tornar suas ações de gestão direcionadas para a eficiência, eficácia e efetividade.
Constitui, portanto:
- - um avanço em relação ao modelo burocrático (com ênfase restrita à eficiência);
- - deslocamento de ênfase: dos processos ‘meio’ para processos voltados aos ‘fins’;
- - deslocamento da noção de ‘interesse do Estado’ para ‘interesse público’ (da coletividade).
Princípios do Paradigma Gerencial
- - confiança na descentralização das decisões;
- - horizontalização das estruturas;
- - descentralização de funções;
- - controle por resultados;
- - incentivos à criatividade;
- - orientação para o cidadão
- - cliente.
Estes valores contrapõem-se, portanto, ao formalismo e o excessivo rigorismo técnico próprio da burocracia tradicional.
Setores do Estado:
I – Núcleo Estratégico;
II – Atividades Exclusivas;
III – Serviços Não-Exclusivos;
IV – Produção de Bens e Serviços para o Mercado.
2.2 Crise do Estado: dimensão fiscal
No contexto da crise do Estado emergem, naturalmente, esforços no sentido de impulsionar sua reforma.
Parece ser hegemônica a posição segundo a qual a Reforma do Estado constitui-se em instrumento indispensável para a consolidação da estabilidade e meio de assegurar o crescimento sustentado da economia.
É ponto freqüente da pauta de debates em todas as instâncias e segmentos da sociedade o papel a ser desempenhado pelo Estado no atual contexto, bem como seu nível de intervenção na atividade econômica.
Mister que se reflita, neste aspecto, os modelos de desenvolvimento levados a efeito no Brasil e o correspondente papel assumido pelo Estado. Nos diversos arranjos que definem as estruturas políticas e econômicas de uma sociedade, o Estado desempenha funções (papéis) que determinarão, segundo o contexto histórico vivido, o grau de eficácia destes sistemas. Assim, a atuação de cada elemento do Estado e da Sociedade deve estar sempre em sintonia com o momento histórico.
Segundo posição, externada em estudo desenvolvido e divulgado pelo governo federal, intitulado “Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado”, a crise do Estado define-se como:
- (1) uma crise fiscal, caracterizada pela crescente perda do crédito por parte do Estado e pela poupança pública que se torna negativa;
- (2) o esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado, a qual se reveste de várias formas: o Estado do bem-estar social nos países desenvolvidos, a estratégia de substituição de exportações no terceiro mundo, e o estatismo nos países comunistas; e
- (3) a superação da forma de administrar o Estado, isto é, a superação da administração pública burocrática.”
Pode ser entendido como aparelho do Estado a administração pública como um todo, ou seja, a estrutura organizacional e funcional do Estado, em suas três esferas e Poderes.
O aparelho do Estado é constituído pelo governo, por um corpo de funcionários e pela força militar. O Estado, de outra parte, é mais abrangente que o aparelho, dado que compreende adicionalmente o sistema constitucional-legal, que regula a população nos limites de um território.
O Estado, consoante já estudado, é a instituição, a organização burocrática, que detém o monopólio do uso legítimo da força. É o aparelho que tem o poder de legislar e tributar a população de um determinado território. Há, pois, que se distinguir os conceitos de Reforma do Estado e Reforma do Aparelho do Estado.
Conforme referenciado com propriedade no “Plano de Reforma do Aparelho do Estado”, a reforma do Estado é um projeto amplo, que envolve todas as áreas do governo e da sociedade, ao passo que a reforma do aparelho do Estado apresenta um escopo mais restrito: “está orientada para tornar a administração pública mais eficiente e mais voltada para a cidadania” (PND - Plano Nacional de desenvolvimento do Estado. p. 17).
Segundo a perspectiva contida no “Plano”: “A reforma do Estado deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser o responsável direto pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção de bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento” (p.17).
“No plano econômico o Estado é essencialmente um agente de transferência de renda, que se torna necessário da existência de bens públicos e de economias externas, que limitam a capacidade de alocação de recursos do mercado. Para realizar esta função redistribuidora ou alocadora, o Estado coleta imposto e os destina aos objetivos clássicos de garantia da ordem interna e da segurança externa, aos objetivos sociais de maior justiça ou igualdade e aos objetivos econômicos de estabilização e desenvolvimento. Para realizar estes dois últimos objetivos, que se tornaram centrais neste século, o Estado tendeu a assumir funções diretas de execução. As distorções e ineficiências, que daí resultaram, deixam claro, entretanto, que reformar o Estado significa transferir para o setor privado as atividades que podem ser controladas pelo mercado. Daí a generalização dos processos de privatização de empresas estatais” (p.17).
Outra dimensão da reforma do Estado que impacta diretamente no redesenho de seu aparelho funcional é a descentralização para o setor público não-estatal da execução de serviços que não envolvem o exercício do poder de Estado, mas devem ser subsidiados pelo Estado. São casos exemplificativos a saúde, a educação, a cultura e pesquisa científica. Este é um processo denominado “publicização”.
“A reforma do Estado envolve múltiplos aspectos. O ajuste fiscal devolve ao Estado a capacidade de definir e implementar políticas públicas. Através da liberalização comercial, o Estado abandona a estratégia protecionista da substituição de importações. O programa de privatizações reflete a conscientização da gravidade da crise fiscal e da correlata limitação da capacidade do Estado de promover poupança forçada através das empresas estatais”. (p.18)
Note-se, por relevante, que as propostas que formatam o modelo de reforma, em tese, são bastante razoáveis e estruturam- se de forma lógica.
Entretanto, é preciso observar as disfunções do modelo. Não se pode perder de vista a dimensão histórica, e o cenário particular da sociedade brasileira. Mister se faz avaliar os custos e impactos sociais decorrentes das medidas a serem adotadas, bem como o nível de subordinação aceitável, afim de que obtenha de fato ganhos generalizados para toda a sociedade.
Assim, no que concerne à liberalização econômica, é imperativo que os governantes não desprezem os impactos negativos da abertura plena e irrestrita das fronteiras comerciais da nação a exemplo do que fazem as economias mais desenvolvidas e historicamente defensoras do liberalismo. Neste mesmo sentido, é necessário avaliar detidamente o processo de privatização de empresas estatais. Parece bastante razoável a privatização de empresas deficitárias e ineficientes, que atuam em segmentos impróprios à atuação do Estado moderno. Todavia, não se pode afastar o fato de que existem segmentos estratégicos sob o ponto de vista de políticas públicas de desenvolvimento econômico, cujo processo de abertura ao capital privado demanda análise mais apurada. Em suma, privatizar unicamente por privatizar (ou para “fazer caixa”) não parece ser ação gerencial digna de mérito, eis que mesmo as economias capitalistas desenvolvidas possuem empresas estatais atuando em setores específicos.
Enviar um comentário
Enviar um comentário