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Prosseguimento da Penetração Chona-Caranga do Sul do Save

As provas linguísticas e antropológicas acumuladas até ao presente permitem afirmar que neste século se intensificou o povoamento chona- -caranga no Sul de Moçambique. 
Feliciano dos Santos defendeu que a língua chope possui nítidas afinidades léxicas com as faladas pelos Chonas-Carangas. Mais convincente é a recente conclusão de C. Bhret que, pelos seus estudos de linguística histórica, reconheceu filiação chona^ao idioma falado por esse estranho povo meridional que, desde o início do See. XVIII, os Portugueses designaram por «Burrongueiro». Deste termo, H. / A. Johnson —em cujo vocabulário C./Ehret se baseou— faz derivar «Rongero».
 
Mais ou menos dispersas por toda a região meridional, mas predominando ao Norte do Limpopo, encontram-se práticas e crenças de provável ou indubitável origem chona-caranga como a saudação por bater de palmas, as técnicas de adivinhação por farejo, fustigação e aspiração e o juramento junto do régio tambor sagrado.

Uma decisiva contribuição antropológica foi dada recentemente por David Webster que, em 1969, realizou em Inharrime pesquisas intensivas e sistemáticas sobre o sistema de parentesco. Segundo este sociólogo, é nessa fundamental faceta da estrutura social que as populações do Sul do Save diferem de maneira mais pronunciada dos seus vizinhos. De facto, os Angunes (Nguni) e os Sothos observam o tipo Iroquois na sua terminologia de parentesco. Já os Tsongas, os Chopes e os Bitongas possuem variações do tipo Omaha, do mesmo modo que os 
Chonas. 

Tanto quanto podemos ver, foram os Chonas-Carangas que contribuíram para a formação de diversas unidades políticas de tipo estadual, dotadas de poder centralizado e de organizações sociais e económicas com maior complexidade e estratificação. Seriam num mínimo de cinco (comprovadamente Ma-Danda, Manecuéni, Gambá, Mucumbi e Inhampura) e num máximo de nove (provavelmente mais Urronga, Sono, Va- -Loi e Tembe). Quer por razões de segurança quer por os respectivos fundadores haverem chegado posteriormente à região e encontrado a zona litoral ocupada por povos de extracto coca, decidiram, na sua maioria, fixar-se nas savanas interiores, menos propícias à ocupação humana, embora a tal distância que não ficassem privadas do contacto com os centros comerciais euro-asiáticos. As únicas excepções a esta regra são constituídas pelo reino de Tembe, que se fixou na baía do 

Espírito Santo, e, •enfim, pelo reino de Inhampura, que ocupou inicialmente a actual planície do Bilene, embora também mantendo a capital afastada da faixa ribeirinha. 

Bem comprovada documentalmente é também a fundação e expansão do reino de Ma-Danda. Entre 1512 e 1515, como dissemos, Inhamunda, rei de Qui-Teve, cuja capital se situava entre os rios Buzi e Save, iniciou extensivas conquistas militares tanto para Norte como para Sul. Os seus domínios tornaram-se tão vastos que, na segunda metade do século, vieram a fragmentar-se. É admissível que os dirigentes do reino derivado que assumiram o título dinástico de Se-Danda, tenham igualmente prosseguido, mas em direcção meridional, uma activa política de expansão territorial, visando, possivelmente, monopolizar as rotas comerciais entre o interior, a foz do Save, o arquipélago do Bazaruto e a baía de Inhambane. No final do Séc. XVI as suas fronteiras estendiam-se «desde Quiteve para o Cabo das Correntes» ou «até às terras que se chamam Botonga que atingem o rio de Inhambane». Aventamos a hipótese de este fenómeno de expansão ter provocado a derrocada do poder central e a dispersão dos súbditos do Estado cujos dirigentes residiam no zimbábuè de Manecuéni. Há, pelo menos, flagrante coincidência entre a datação arqueológica da desocupação deste centro e a datação documental da expansão do reino de Ma-Danda. 

O relato das vicissitudes dos náufragos de 1589 não permite dúvidas sobre a origem chona-Jcaranga do reino de Inhampura: 
«...baixam  à praia  trezentos cafres  diferentes dos passados (da Manhiça) no traje, na comunicação e em tudo; nas cabeças 

muitos cornos que, ou fossem armas ou ornato, os faziam enormes; traziam arcos e flechas nas mãos. Estes eram os Mocrangas, de cuja inhumanidade o Inhaca os avisara... Este conflito se aquietou com a chegada de um cafre que... apartou e despediu os outros e disse ao capitão que os guiaria para o rei de Ampuro...». 
Outra unidade política fundada por imigrantes de origem chona- -caranga foi conhecida pelo nome de Nualungo (Nwalungu) — primitivamente ocupando a savana, a leste dos Libombos, entre Magude e Pafuri. Segundo a tradição veio a dividir-se em dois ramos principais: a) os Va-Lais já referidos; os Maluleques (Maluleke) que, na área do Pafuri foram precedidos pelos Nhai (Nyai), também chonas- -carangas, até recentemente considerados «donos do país» e exclusivos oficiantes em propiciações e sacrifícios. 
Sono foi outro reino que, em meados do Séc. XVI, se deslocou com outros chonas-carangas para a região entre o Save e o Limpopo. Aparece, com grande destaque, localizado sobre o Trópico de Capricórnio, pelo menos em quatro antigas cartas: Bartolomeu Velho (1561), Duarte Lopes (1591), João Teixeira (1630) e Guillaume Delisle (1708). 

É também referido, com algum pormenor, no precioso relatório sobre Inhambane escrito por Castro Soares em 1729 e numa tradição oral coligida por H. A. Junod no princípio do século. 
Mas a mais 'sólida das provas documentais sobre as imigrações chonas-carangas refere-se ao reino fundado por Gamba sito a 180 km a sudoeste de Inhambane e a 8 km a norte do Inharrime, onde viveram os missionários jesuítas de 1560 a 1562. Esta unidade política tem para nós especial significado porque, ao contrário do que outros têm defendido o consideramos como um exemplo precoce do modelo cultural que veio a ser desenvolvido pelos chamados «Tsongas»: a monarquia centralizada e os poderes pluviais do monarca; a estratificação social com predominância dos caçadores, comerciantes e adivinhos (um destes até dono de escravos); a ausência da prática da circuncisão; a projecção social e económica da caça ao elefante; o menosprezo varonil pelas tarefas agrícolas; o desinteresse pelas fruteiras e produtos hortícolas já correntes em Inhambane; o apreço pela carne de bovinos e animais de grande porte; a existência de ferreiros e tecelões; a atenção da casa real pelo comércio externo; a avidez da classe dominante por missangas e tecidos importados, apesar dos ornamentos de cobre e da indústria artesanal de algodão, etc. De excepcional relevância se nos afiguram as observações que André Fernandes incluiu na sua carta de 5 de Dezembro de 1562, isto é, após dois anos e meio de permanência no local, com melhor conhecimento da língua e dos costumes. A predominância das actividades venatórias marcava o carácter do homem com facetas de independência pessoal e de ressentimento contra o controlo social e político. O ambiente ecológico também se assemelhava ao preferido pelos Tsongas: savana arbórea, secas frequentes, raro gado bovino. 

Tudo isto aponta para estruturas, sistema de valores e fundamentos económicos diferentes dos que vieram a dar forma à cultura chope. Mas, em 1589, a cultura local aproximava-se ainda mais do modelo tsonga: tinham refeito as manadas de bovinos graças às férteis pastagens e, decerto, ao afastamento da mosca tsé-tsé devido à intensificação das derrubas e cultivos. Continuavam a manter estreitos contactos comerciais com Inhambane e, acima de tudo, manifestavam maior abertura para com o mundo exterior, recebendo os náufragos «•como conhecidos...», «com muita festa, cantando e dançando ao som dos seus instrumentos...» Esta atitude contrasta, vivamente, com a dos «Mucarangas, ladrões e desumanos», cujas terras tinham atravessado sob a ameaça permanente de rapinas e agressões. Este último povo encontrava-se, por conseguinte, mais próximo do modelo isolado e introvertido que veio a caracterizar a cultura chope. 

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