Nesta situação, a burocracia, enquanto elemento integrante
de uma estrutura tripartite (Estado, sociedade civil e burocracia), assume o
papel de segmento mediador entre a
sociedade civil e o Estado. Materializar a interface de conciliação entre o
interesse universal (Estado) e os interesses particulares das corporações
privadas (sociedade civil) constituiria sua missão fundamental (Tragtenberg,
1992).
Conforme Lefort (1983), a burocracia figura como um
organismo “especial” no âmbito da sociedade. Não constitui, contudo, uma classe
ou um segmento semelhante àqueles passíveis de serem identificados no interior
de uma classe. Sua existência está condicionada, pois, à divisão da sociedade
em classes permeadas por antagonismos irreconciliáveis. Neste ambiente de
conflito entre as classes, a burocracia assume a função de garantir a
manutenção das regras que instituem uma ordem comum de dominação.
A burocracia assume, assim, a condição de um “órgão” posto a serviço da classe dominante, localizada de algum modo entre os dominantes e os dominados (Lefort, 1983).
A Perspectiva de Max Weber
Os estudos de Weber, especialmente acerca da burocracia,
suas características e implicações, marcam a transição da teoria da
administração para a sociologia da organização (Tragtenberg, 1992). O fenômeno
burocrático é analisado por Weber sob três aspectos distintos, quais sejam: o político, enquanto manifestação do
sistema dominante; o sociológico,
como uma organização social; e o administrativo,
enquanto aparelho encarregado de sustentar racionalmente o controle dos
processos administrativos (Lakatos, 1991).
Segundo a concepção weberiana, a burocracia constitui um
tipo de poder. Representa um sistema onde a divisão do trabalho é orientada
segundo os objetivos visados de forma essencialmente racional.
No que se refere aos fundamentos (motivos, interesses, etc.) que revestem e sustentam determinada relação de dominação, cabe destacar o aspecto denominado legitimidade. Segundo Weber (1991), as relações de dominação não se mantém voluntariamente assentadas tãosomente sobre motivos materiais, afetivos ou racionais; buscam, fundamentalmente, despertar e manter, em relação ao grupo, a crença na legitimidade desta relação. Assim, a natureza da legitimidade que se busca alcançar deve variar segundo a relação de dominação, que envolve desde a forma de obediência que molda a essência dessa dominação, passando pelo grau de estabilidade da relação, até as conformações e características do aparelho administrativo que visa a darlhe sustentação.
O exercício da dominação sobre um grupo demanda, via de
regra, a existência de um quadro
administrativo vinculado ao dirigente, seja por motivos afetivos, de costume, ou de caráter racional-legal.
De fato, Weber descreve os três tipos puros de dominação legítima existentes: a carismática; a tradicional; e a racional (legal). Faz isso considerando basicamente a natureza das crenças que sustentam a posição de dominação do governante - o que legitima sua atuação -, e a característica do aparelho administrativo que garantirá a execução das suas ordens.
Na relação social de dominação do tipo racional-legal, a
burocracia constitui o aparelho administrativo correspondente. A burocracia é
concebida, assim, sob a visão administrativa, como uma expressão do sistema de
dominação racional-legal.
A noção de burocracia para Weber (1976) está associada a uma construção social envolvida por um alto grau de formalismo, implementado por um conjunto de normas escritas, contemplando uma estrutura de cargos estabelecida de forma hierárquica segundo uma divisão tanto vertical, quanto horizontal do trabalho. O recrutamento de seus membros – os funcionários que integrarão os quadros - se processa com atenção ao princípio da impessoalidade; critério segundo o qual orienta-se, também, a relação interna corporis. (ver características do modelo burocrático em Chiavenato, 1993).
Disfunções da Burocracia
Se para Weber a burocracia constitui a forma de organização
eficiente por excelência, apresentando como principais vantagens a
racionalidade, a precisão, a univocidade de interpretação, uniformidade de
rotinas e procedimentos, constância e continuidade, entre outras; Merton
(1978), de outra parte, identifica conseqüências imprevistas ou disfunções que conduzem à ineficiência
da organização burocrática. Tais anomalias de funcionamento da estrutura
burocrática decorrem, segundo o autor, a interação
do elemento humano com o modelo burocrático preestabelecido.
As disfunções apontadas por Merton podem ser sintetizadas como:
- a) a internalização das regras e exagerado apego aos regulamentos;
- b) excesso de formalismo;
- c) resistência às mudanças;
- d) despersonalização dos relacionamentos;
- e) categorização como base do processo decisório;
- f) superconformidade às rotinas e procedimentos;
- g) exibição de sinais de autoridade;
- h) conflitos com o públicocliente (ou usuário).
Weber, no entanto, já observara a fragilidade da estrutura
racional. Segundo Etzioni (1976), um típico dilema da organização burocrática
é, por um lado, a atuação constante de forças exteriores à estrutura para
encorajar o burocrata a seguir outras normas diferentes daquelas estatuídas
para a organização, e por outro, a tendência ao enfraquecimento do compromisso
dos subordinados com as regras burocráticas.
Assim, em face
do elevado nível de renúncia necessário à manutenção da capacidade de
restringir-se às normas, “as organizações
burocráticas tendem a se desfazer, seja na direção carismática, seja na
tradicional, em que as relações disciplinares são menos separadas das outras,
mais naturais e afetuosas” (Etzioni, 1976, p. 85).
Outro aspecto disfuncional a ser sublinhado nas organizações formais, é o formalismo - distanciamento entre o plano formal e o real.
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