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O Estado dos Undis em Moçambique - História

Divergem largamente entre si as tradições orais alusivas aos motivos que levaram o primeiro Undi a separar-se do Caronga e a partir para ocidente. Algumas dessas tradições são defendidas por descendentes dos clãs autóctones e parecem constituir um compromisso entre a prévia ocupação da região por outro povo e as origens estrangeiras dos aristocratas proto-maraves, do clã pirí

De harmonia com a versão oficial do Undi e da sua corte, o dissidente partiu acompanhado por todos os anciãos e as mulheres da linhagem dirigente do clã pirí, o que dá a medida da sua posição hierárquica superior. Era talvez o n'cósuè (nkhoswe) da sua mbumba, a matrilinhagem real. 

Desconhecem-se as razões verdadeiras que decidiram o Undi reinante a transferir a sua capital para Mano, no norte da actual província de Tete. Entre as hipóteses avançadas está a de procurar uma posição estratégica entre os centros comerciais portugueses no vale do Zambeze, de Tete ao Zumbo, e as regiões setentrionais e ocidentais onde abundava o marfim e o cobre. Fosse qual fosse a razão, ela afigurava-se suficientemente poderosa para que deixasse atrás o santuário de Capi- rintíua e a sua Maqueuana, nessa área periférica da Cordilheira do Dzaranhama onde o poder central dos Undis nunca foi incontestado, apesar da importância desempenhada por este culto territorial entre os Maraves em geral. 

Remonta a 1614 a mais antiga referência documental portuguesa a um dos Undis, já então firmemente estabelecido no Mano, atingindo as suas fronteiras meridionais o próprio rio Zambeze. Parece que esse local se situava na confluência dos rios Luia e Muagazi e era conhecido por Msito Mano. 

Embora os sucessivos Undis pudessem ter mudado as suas capitais, o topónimo Mano passou a designar toda a região sob o seu controlo directo, entre o Capoche e o Luia. O Mano e a Chipeta constituíam assim os centros nucleares e primordiais a partir dos quais o Estado se expandiu em todas as direcções. Os vice-reinos de Mecanda, Calindaualo e Chipeta não são aqui tratados por se situarem fora do actual território de Moçambique. 

Os imigrantes impuseram-se às dispersas populações autóctones fazendo ressaltar a superioridade do seu sistema político na arbitragem das disputas entre grupos rivais e exibindo superiores poderes de carácter ritual, mágico-religioso e até sobrenatural. Este tipo de imposição, de preponderância pacífica, associado a eventuais conquistas militares, deve ter-se expandido a partir de um centro cuja consolidação se processou em tempo curto, da ordem de uma década. 

O facto de os Undis nomearem, por vezes, mulheres do clã pirí para o governo de novas províncias, leva a inferir que a expansão se processou de modo tão acelerado que esgotou a reserva de familiares masculinos aptos para o desempenho de funções governativas.  

O carácter e a capacidade dos primeiros monarcas desempenharam, decerto, importante papel. Foram personalidades talentosas esses Undis que dirigiram as migrações, deram consistência ao novo Estado e encorajaram a sua expansão. Tinham, sem dúvida, conhecimento prévio da constituição de  unidades políticas mais vastas,  de tipo estadual, baseadas em tributos, cujos monarcas reuniam fortes e concentrados poderes. O declínio do poder central dos Carongas foi aproveitado pelos Undis para estenderem a sua influência por regiões orientais, outrora sob firme domínio daquele monarca, como a Chipeta. O certo é que, com o tempo, se transformaram nos mais poderosos dos chefes maraves.

Um dos primeiros Undis modificou o sistema de sucessão da monarquia central de modo a recair apenas nos filhos das suas irmãs. Mas esses potenciais herdeiros também foram frequentemente nomeados vice-reis (na terminologia de Langworthy) dos novos domínios. Com o decorrer do tempo criou-se um curioso sistema de parentesco perpétuo entre os dirigentes políticos. Todos os chefes pertencentes ao clã matrilinear piri se consideravam irmãos juniores, filhos, primos, sobrinhos de cada Undi reinante. Aconteceu até que um deles (Chimuala, no actual distrito da Marávia) foi classificado como «tio perpétuo». Este sistema foi tornado extensivo ao clã autóctone banda. Era possivelmente a este sistema que pretendia referir-se Mello de Castro em 1763: «Aos Reis e Régulos que falecem nos seus domínios não sucedem os próprios filhos mas sim os do Imperador e seus netos por ele mesmo nomeadas».

Não é de desprezar a hipótese de, com a sua partida para longes domínios, esses parentes perpétuos procurassem evitar as frequentes e mortíferas acusações de feitiçaria que desagregavam a família extensa. Seja como for, a possibilidade de conflitos entre o Undi e os seus parentes foi afastada graças à natureza descentralizada da estrutura política do Estado. Há provas de mais frequentes litígios entre a linhagem real dos Carongas do que entre a dos Undis. Os fundadores de novas unidades políticas (Undi, Chulo, Capuíte, Rundo) partiram devido a disputas de sucessão ou a qualquer outro tipo de conflito. Já no Estado dos Undis se desconhecem quaisquer contendas sucessórias até ao Séc. XIX, época em que se agravaram os factores de debilidade interna.

Nos territórios onde permitia que o governo fosse exercido por outros clãs, o Undi casava com «princesas» locais e designava como vice--reis os filhos havidos desses matrimónios políticos. Outras vezes casava com uma irmã do chefe local, dando-lhe simultaneamente uma das suas irmãs como esposa. Assim ficava tanto ele como os seus sucessores unidos aos Undis como «cunhados perpétuos», solucionando o problema da identificação com o poder central. Tal aconteceu com Chifuca, do clã lungo, entre os rios Mucanhe e Aruangua. 

Tudo indica que foi bastante activa a participação pessoal dos primeiros Undis nos negócios do Estado, muito embora não seja de desprezar a contribuição que os diversos vice-reis deram para a expansão dos domínios reais. 

Um dos primeiros vice-reinos a ser constituído foi o de Canguro, ocupando as terras baixas entre o maciço motanhoso do Furancungo e o vale do Baixo Luia e o seu afluente Luangua. Existe a tradição de já constituir uma unidade política formada por Zimbas, por ocasião do advento do primeiro Undi. Ignoramos se essa tradição seja mera racionalização artificial destinada a acentuar a sua recente independência em relação ao poder central, já evidente por ocasião da travessia de Gamito em 1831. Contudo, o seu dirigente pertencia também ao clã piri. 

Quanto ao Bive, outro dos primeiros vice-reis, parece ter sido estabelecido na Muchena, fértil planície sita no vale inferior do rio Revubuè. Reinava possivelmente sobre parte dos Zimbas, que o mapa de Bartolomeu Velho (1561) já situou naquela região. Era também do clã piri. 

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